Bem ao gosto do diretor/roteirista Cronenberg, “Cosmópolis” é um filme complexo, profundo, que mistura o real e o bizarro para transmitir muito. É o tipo de “filme cabeça” que apresenta muito conteúdo de uma vez, e do qual é difícil de falar sem começar uma discussão, inspirado pela obra de mesmo nome de Don DeLillo (versão em português pela Companhia das Letras).
O enredo acompanha um dia da vida do jovem bilionário Eric Packer (Robert Pattinson), que decide atravessar a cidade para fazer um corte de cabelo. Eric fez fortuna prevendo movimentos das bolsas de valores mundiais e gerenciando patrimônio, mas enquanto faz sua tortuosa viagem pela cidade, sua empresa está se desmantelando devido a uma aposta mercadológica errada. Enquanto lentamente o passeio começa a refletir sua ruína financeira, o bilionário encontra uma série de personagens que o levam a um caminho de ruína pessoal.
“Cosmópolis” é estranho. Há um elemento leve de pânico implícito por toda a produção, que fica cada vez mais claro quando notamos que toda a desgraça, a decadência e a problemática levantada pela trama é cada vez mais real. Como os trailers não se cansaram de repetir, este é um filme sobre o novo milênio. Estamos falando de um mundo em que pessoas importam menos que coisas ou dinheiro. A informação é a nova moeda. Se você não tem informação ou dinheiro, não tem nada.
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A mecânica do filme tem um estilo quase onírico, que lembra muito os encontros aparentemente sem conexão de histórias como “Alice no País das Maravilhas”. Eric encontra funcionários de sua empresa e outras figuras, com a trama construída de longas conversas com muita teoria e pouca ação. É como se lêssemos diversas dissertações sobre economia, tecnologia, psicologia e a condição humana. Os diálogos, extremamente bem trabalhados (com um crédito válido ao elenco e o jeito blasé do personagem de Pattinson), misturam assuntos e se interrompem com frases que por vezes parecem fora de contexto, mas acabam fazendo parte de um “plano” maior. As conversas começam abruptamente e terminam do mesmo modo, muitas vezes com transições secas, com a próxima cena sem continuidade direta, tirando referências e (propositalmente) confundindo o público.
Eric passa boa parte do filme no carro, uma limusine branca (como muitas outras da cidade) repleta de computadores de altíssima tecnologia e vidros que se escurecem com o apertar de um botão. Esse é seu lugar favorito, seu local de trabalho e, como as cenas e os personagens deixam bem claro, sua casa fora de casa. A subversão de localizações, do privado com o público e do pessoal com o profissional deixa um gosto ruim na boca, com bizarrices como um banheiro oculto na própria limusine ou um check-up médico dentro do próprio carro. Quando Eric sai do carro, parece que fica fora de seu elemento. Fica a idéia de que no “novo milênio” não existirá separação alguma, e isso consegue chegar a um incômodo extremo.
Esses elementos “fora de lugar” ficam mais graves ainda pela naturalidade dos personagens em relação e eles. Aqui entra uma discussão sexual interessante: Eric é recém-casado com a poetisa Elise (Sarah Gadon), que se recusa a manter relações com o marido, pelo motivo simples de que eles mal se conhecem. Ao mesmo tempo, Eric procura em outras mulheres o que Elise não oferece, abrindo a discussão para a materialidade do sexo. Quase paralela à sexualidade, a violência é abordada em algumas cenas marcantes, com surpresas e simbolismos que não ficam longe desses.
Cada diálogo, além de seu significado solitário, sempre é acompanhado de elementos que o reafirmam, seja direta ou simbolicamente. Nada acontece por si só e sem ligação, sendo que até os movimentos ou ações aparentemente inofensivas dos personagens carregam muito significado. A própria viagem pela cidade e os eventos que cercam a trama principal podem ser vistos como grandes metáforas.
Um segmento especialmente perturbador tem uma funcionária de Eric dissertando sobre a natureza do dinheiro e a evolução da humanidade. De acordo com ela, o futuro está cada vez mais impaciente para acontecer, as coisas estão mais rápidas, mas esse é um futuro que pode não ter lugar para todos, por isso aqueles que não tem condições de participarem dele o temem e querem evitá-lo. O dinheiro, ela explica, hoje é mais rápido que o tempo, de modo que usa-se dinheiro para comprar tempo, enquanto no passo o oposto era o real.
Além do peso dessa dissertação, enquanto ela ocorre, há um mal-estar quando assistimos uma multidão revoltosa vandalizar a limusine. A dupla mal consegue ouvir as pancadas, gritos, latas de spray e o lixo sendo arremessado, continuando a discussão ignorando os sacolejos do veículo. Ficamos sem saber de que lado do carro deveríamos estar e, mais do que isso, se seria possível fazer qualquer diferença do lado de fora, vendo o protagonista aparentemente intocável, seguro e inabalável frente à destruição
A queda econômica da empresa é refletida na queda “humana” de Eric. Ambos se desmantelam conforme o filme progride, restando a discussão da fragilidade desse sistema e o que representa a vitória ou a derrota quando uma mera ação, hesitação ou especulação pode arruinar tudo.
Não é nem de longe um filme para o grande circuito, o que levanta algumas dúvidas inexplicáveis por sua distribuição em várias salas para o grande público, ao lado de estréias mais hollywoodianas.
Os longos diálogos, muitas vezes cheios de quebras, elementos aparentemente sem continuidade e o ritmo lento, claustrofóbico e pessimista da produção podem fazer com que muitos desistam no meio e saiam da sala. Se você esperava não quer pensar muito ou não tem paciência para muitas conversas, passe longe.
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